O telefonema de Johnny Saad para
Fernando Haddad
Paulo Nogueira
Diário do Centro do Mundo
19 jun 2014
“Recebi um telefonema de um dono de
muitos meios de comunicação dizendo que não daria trégua à prefeitura e que
colocaria todos seus veículos contra o IPTU progressivo. Isso não me foi
contado. Isso foi dito.”
Bem-vindo
ao mundo como ele é, Haddad.
Haddad
disse aquilo a jornalistas. Preferiu não dar o nome do empresário. Mas o site
Conversa Afiada logo descobriu de quem se tratava: de Johnny Saad, dono da
Band.
É um
episódio que traz diversas conclusões.
Primeiro,
e antes de tudo, ele mostra como funciona a mídia corporativa. O dono manda
seus empregados defenderem a causa dele próprio, e a sociedade é bombardeada
com um noticiário viciado.
Saad
é dono de imóveis em São Paulo, e isso significa que ele teria que pagar mais
IPTU.
O
brasileiro ingênuo – cada vez em menor número, felizmente – tem uma fé cega
naquilo que ouve, vê e lê na mídia. Não tem ideia dos interesses por trás do
noticiário.
Depois,
há uma questão de moralidade. Saad tem uma concessão pública, a televisão. Como
ele se atreve a usá-la em seu favor?
Algum
tempo atrás, o executivo da ONU que trata da liberdade de expressão, Jacques de
la Rue, notou um fato curioso.
Em
muitos países, o Brasil entre eles, as pessoas que receberam concessão pública
para ter uma tevê ou uma rádio usam isso com a única finalidade de
enriquecerem.
Para
ficar no caso mais dramático, os três herdeiros de Roberto Marinho estão no
topo da lista das maiores fortunas pessoais do Brasil.
Concessão
pública não foi feita para que um pequeno grupo se locuplete.
Por
isso, há necessidade de regras que coíbam abusos e fiscalizem o uso decente de
concessões.
Cristina
Kirchner deu um exemplo de combatividade ao enfrentar a mesma situação na
Argentina, ao preço de um colossal desgaste derivado da resistência feroz do
grupo Clarín.
Mas
não fraquejou e venceu.
Terceiro,
o episódio do telefonema mostra uma coisa importante: na Era Digital, uma boa
forma de tornar públicos absurdos privados é por vazamentos.
Nenhum
órgão das empresas jornalísticas – Folha, Veja, Globo, Estadão – publicaria a
denúncia de Haddad, e os brasileiros não saberiam da brutalidade de Saad ao
telefone.
A
informação foi vazada, e a Band é obrigada a enfrentar a vergonha do telefonema
de seu dono.
Foi
fruto de um vazamento, também, o furo do ano no Brasil: a trapaça fiscal da
Globo na aquisição dos direitos da Copa de 2002. O site Cafezinho publicou a
documentação, passada por alguém inconformado da Receita Federal.
O
Brasil foi ocupado – na acepção do Movimento Ocupe Wall St – pelas companhias
de mídia. Elas se valem de tudo para manter seus privilégios e os do pequeno
grupo a que pertencem. Usam seus empregados como se fossem gado para
propalar mentiras que lhes convêm.
Fui
um deles, aliás.
Vazar
informações que ajudem num processo imperioso de desocupação é um ato que
beneficia toda a sociedade. Que todos que possuem informações relevantes se
lembrem disso.
Reproduzido
de Diáriodo Centro do Mundo
19
jun 2014Leia também:
"Constituição Federal - Capítulo da Comunicação Social" (1988), clicando aqui.
"Ley dos Medios Argentina" - Lei nº 26.522 – Lei de Serviços de Comunicação Audiovisual –, em 10 de outubro de 2009, clicando aqui.
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